Apresento a Crônica do amigo ...
================= Luiz Carlos Casemiro================
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No curso ginasial tive a sorte de encontrar respeitáveis
professores, mestres para ensinar e educar alunos para a vida. Muitos deles
serão inesquecíveis, tanto pela cultura, tanto pela capacidade de transmitir conhecimentos,
bem como pelos exemplos de condutas éticas e morais. Por causa deles o
Instituto de Educação Doutor Cardoso de Almeida, de Botucatu, conhecido
simplesmente como a Escola Normal, atraía alunos de lugares distantes. Quando
havia vagas para professores nos concursos de ingresso ou de remoção, estas já
eram preenchidas no primeiro dia, tal a boa reputação da escola.
Em outra crônica que
escrevi há algum tempo destaquei dois professores. O Cid Augusto Guelli, de Matemática. Um
gênio para o bem ou, para o mal. Adorado por uns, temido por muitos, respeitado
por todos. O professor que mais reprovava alunos. As futuras gerações de alunos
aliviaram-se do terror de levar bomba do Professor Cid Guelli quando ele se afastou
do magistério público; abriu na capital paulista o primeiro curso
pré-vestibulares, o Anglo Latino, no bairro da Liberdade.
Outro mencionado foi o
professor José Pedretti Netto. Entrava na classe e encontrava os alunos em
algazarras, fato corriqueiro entre uma e outra aula. Nem admoestava os
discípulos a se calarem; de pé, entre a mesa e as carteiras, mansamente
iniciava narrar a matéria -- era mestre de História. Despertava interesse. Se uma
mosca voasse na sala de aula poder-se-ia ouvi-la zumbir.
A seguir, apresento outros grandes mestres.
Flávio
Lobo era o professor de Desenho. Metódico, numa semana a aula versava sobre
estudo geométrico, noutra, desenho artístico. Quem podia comprava dois cadernos
especiais para os exercícios de sua matéria; isto ocorria com alunos, filhos de
pais abastados. Estudantes como eu, cujos pais de parcas posses, utilizavam um
só caderno, dividindo-o do início à sua metade para um assunto e, do final ao
meio, para os trabalhos da outra matéria. Foi ele, morador na parte baixa da
cidade, quase às margens do Córrego Lavapés, o primeiro botucatuense a possuir
aparelho de televisão. Captar imagens, nessa época, somente com imensas antenas. No quintal de sua casa estava a altaneira
torre semelhante a um poço de petróleo dos filmes americanos.
O Sr. Flávio foi dos
primeiros professores a utilizar-se de automóvel para chegar à escola. Carro
brilhava de tão bem conservado. Minha
prima Ednea que se formou professora nessa mesma escola, dois anos depois de
mim, contou-me este fato. Quando ela cursava a quarta série do ginásio, uma colega
– naqueles dias de final de ano letivo – perguntara ao professor Flávio quem
teria sido o seu melhor aluno em desenho.
Para surpresa da Ednea ele citou o meu nome, entre vários. Tempos
depois, quando soube dessa informação, também eu fiquei surpreendido. E muito! O
professor Flávio comedido e econômico em elogios jamais me confessara
isso. Se dito, talvez pudesse ter
alterado o rumo de meus estudos posteriores, mas do que fiz – professor de
Geografia - não me arrependo.
A professora Dinéia
Ducatti veio removida de Piracicaba para Botucatu no ano em que eu cursava
a terceira série ginasial. Ela adotava, sem se conhecerem, o mesmo expediente
utilizado pelo professor Renato da Silva Cardoso, dono do mais conhecido
cursinho de preparação para o exame de admissão ao ginásio da cidade. O
preparatório ficava na rua lateral da Praça do Bosque, do outro lado do Cine
Cassino. Eu e meu irmão estudamos lá. O
método: dispor mapas pendurados nas duas lousas. Essas cartas destacavam
países, sendo um mapa político, com as cidades, estradas e ferrovias. Outro mapa
abrangia mesma região com fenômenos de relevo, vegetação e hidrografia. Essa professora, moça, loira, muito bonita,
utilizava comprida régua desenvolvendo o estudo, comparando no espaço regional,
o casamento do Homem com o meio físico da região focalizada. Ela conseguia –
pelo menos para mim que sempre adorei essa Ciência – mostrar em plantas
geográficas a maneira de como pessoas ocuparam determinado território e o porquê
de algumas cidades, por reunirem fatores geográficos favoráveis, são mais
desenvolvidas do que aquelas menos aquinhoadas de tais elementos.
Ela percebendo o meu interesse pela matéria
nomeara-me responsável por pendurar os mapas nos quadros-negros. Desconfio que
assim o fez para poupar-lhe esticar-se toda, de costas para a classe, evitando
com isso ser alvo dos olhares gulosos de um bando de adolescentes. Eu recebia
advertências dos meus colegas, tipo assim: “Se manca cara! Vê se falta amanhã
da aula de Geografia. Tá”!
O professor João de
Queiróz Marques lecionou longos anos, em toda sua carreira de magistério,
na nossa Escola Normal. A matéria conhecida como Ciências Físicas e Biológicas
abrangia vasto campo do conhecimento humano.
Ele era craque em todas essas áreas. Ele dispunha de ampla sala no anfiteatro
da escola, bem como de laboratório na parte baixa do prédio. Para auxiliá-lo
havia um bedel, o Senhor Chico, a quem se incumbia de preparar e recolher os
materiais de diversas experiências.
Perto de uma das portas
do salão ficava exposto para estudos, pendurado pelo crânio, um esqueleto
humano (de verdade!) batizado pelos alunos de Serafim, nome que lhe caía como
uma luva. Recentemente li um artigo de jornal de Botucatu relacionando pessoas
famosas sepultadas no Cemitério Portal das Cruzes (meus pais, não tão
conhecidos, descansam lá) e não me contive em rir por causa da inusitada informação
de que o Serafim, por vontade expressada ainda em vida pelo Seo Queiróz,
finalmente repousa em paz no mesmo jazigo onde o professor foi inumado.
Enterrados juntos. Merecido desfecho para quem serviu de modelo de ossos para
estudantes que depois se formaram em medicina... Alguns, até ortopedistas.
Como a escola mantinha quadro de
ótimos professores, o assunto não se esgota aqui. Em breve descreverei recordações
que guardo de tantos mestres. Cito por exemplo: dona Durvalina; dona Jair (isso
mesmo, é mulher); Prof. Paulinho; Maestro Aécio; Prof. Barbosa; Padre Pisani;
Prof. José Sartori; Prof. Gadelha; “Seo” Pacheco; a Margarida; o Fernão; o
Godinho e, até, do Curso Primário lembro-me da conceituada Dona Zuleika
Pavão, que depois de aposentada a sua diversão era debruçar-se por horas na
janela de sua casa, situada entre o Escritório e a Escola de Formação de
Telegrafistas da E.F.Sorocabana, controlando a passagem de pessoas pela Rua
Major Mateus.
Dessa janela, rente à calçada, na única
via de ligação do Bairro da Estação ao Centro de Botucatu, ela observava todas as
pessoas que se deslocavam a pé. Saía até alguma prosa rápida com as mais
chegadas. As identidades das poucas pessoas que utilizavam o velho ônibus da
Viação Trevisani (linha Vila dos Lavradores x Lavapés) ela saberia mais tarde quando
o coletivo retornasse ao Bairro. Na ida descia rápido a ladeira muito íngreme
nesse quarteirão de sua casa onde na parte baixa estava o pontilhão da ferrovia
e lá no alto a cooperativa de consumo dos ferroviários. Na volta o ônibus subia
lentamente, gemendo na rampa e, nessa vagareza, os olhos já cansados de dona
Zuleika espreitavam todos os passageiros.
Luiz
Carlos Casemiro
casenora@terra.com.br – Telefones (11)
3673.2617 e (11) 999.05.1000.
OBS: A ortografia
utilizada é a anterior à reforma de 1990 por opção sentimental.
São Paulo
(SP), 10 de Agosto de 2014. rev.
Darei, obrigado por divulgar a minha crônica.
ResponderExcluirDarbi
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