quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

ACONTECEU EM BOTUCATU EM 1962.... mensagem do Professor Luiz Carlos Casemiro

Amigo Darbi:
                        Tenho acompanhado pelo seu Blog do Jubileu o andamento dos trabalhos, da divulgação de fotos, narração de fatos interessantes..... a festa já está "pegando fogo" graças ao seu empenho.  Parabéns.
                        Como entrei há pouco no Facebook e, como tenho computador lento, ainda não manejo e não sou capaz de anexar fotos e textos para divulgação.
                        Sugestão para sua turma: na nossa festa foi pedido que se fizessem crônicas, poesias, músicas que lembrassem a escola, a turma, os professores, as carreiras, as amizades etc e tal. Pode esperar que aparecem grandes revelações, mas de modo geral, a produção é pequena, pois nem todos gostam de redigir ou historiar.
                      Por exemplo: na nossa festa escrevi a crônica que estou anexando nesta mensagem. Se v. quiser, pode divulgá-la.  Há fatos comuns de todas as formaturas do nosso querido curso Normal.
                       Abraços
                                          Casemiro
PS: Minha mulher, Eleonora  - também professora - tem acompanhado e elogiado o seu Blog.


                              ACONTECEU  EM  BOTUCATU  EM  1962

                                      Crônica de Luiz Carlos Casemiro  
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                    O ano é de 1962. O mês é novembro, fim de novembro, quase verão. Três moços carregam, encabulados, um enorme painel de madeira escura. Imbuia. Pelo jeito dos rapazes aquilo pesa muito.  A cidade é Botucatu, conhecida pelo “slogan” de “Bons Ares e Boas Escolas” (isso é verdade!).  No alto-falante do beiral, lá em cima, do prédio do Cine Paratodos, toca a oração da Ave-Maria com a suave música de fundo.  Há paz! Muita paz!  Sopra o vento fresco que sobe da serra e atinge essa gostosa cidade. Há sol, agora ele se põe depois das 7 horas.
                     Com diversas excelentes escolas – a cidade não tem faculdades –  o nível máximo atingível é a formação dos professores da conceituada Escola Normal. Os recém-diplomados merecem a honraria de ficar com suas fotos, de togas e becas, expostas no enorme saguão do novo prédio da Drogasil da rua Amando de Barros .
                     Nesse ano, em outubro, o Diretor da Escola Normal, o Professor José Pedretti Netto, incumbiu aos próprios alunos  cuidarem do painel. As fotos de professores, inclusive a dele como novo Diretor, pois substituía o aposentado Adolpho Pinheiro Machado,  repassaria ao responsável pela confecção do quadro deste ano.  O Pedretti que fôra nosso Professor de História, era um exemplo a ser seguido, pois em suas aulas poder-se-ia ouvir uma mosca voando, silêncio absoluto, tão interessante ele narrava as epopéias.  Zum-zum na classe, somente quando ele recebia de presente, de alunos, lápis com propaganda. Sua coleção já atingira mais de 500 exemplares.  No ginasial havia um colega, Olavo Nunes da Silva, falecido precocemente, pouco sabia da matéria, porém era ele o maior fornecedor desses mimos ao professor.  Dizíamos, e o Olavo ria, esse puxassaquismo é a sua salvação da segunda-época em História.
                     Por intercessão do Professor de Desenho Pedagógico, José Barbosa, fui nomeado para refazer o painel.  Retirar as fotos do ano anterior, afixadas sob vidro. Tinha guarnições aparafusadas. Limpeza, reenvernizamento. Receber fotos dos colegas e fixá-las no quadro.  Escrever seus nomes, e as cidades de suas origens, com letra tipo bastão.  Eu indiquei o colega Sérgio para me auxiliar. 
                     Fomos “apresentados” ao painel que estava encostado no fundo da sala de exames biométricos de Educação Física. Sim, havia isso. Enorme, pesado, empoeirado. Decidimos que seria melhor levá-lo para minha casa.  Nesse ano de 1962, minha mãe fôra transferida para o Dispensário de Tuberculose da Mooca, em São Paulo (ela era responsável pelos exames tuberculina e testes de Mantoux).  Por causa disso, e para concluir o Curso, fui morar com minha tia Izabel, solteira, idosa, na Rua Djalma Dutra, esquina com a Rua Curuzu, ali pertinho da ponte do Chafariz da Bela Vista.
                    O transporte do Quadro da Escola para minha casa não seria fácil. A primeira idéia que surgiu: retirar os bancos traseiros do fusca do professor Godinho e, sabe Deus como, aninhá-lo ali.  Nãonãonão, disse o mestre de Matemática.  O bedel, Sr. Winckler, arrumou um amigo que tinha caminhote.  Eis o quadro na sala da minha tia.  Ela a princípio não aprovou essa intromissão; depois, aceitou.  Ficou orgulhosa de seu sobrinho ter a honrosa missão.
                   As fotos eram tiradas no estúdio do Progresso Garcia, misto de fotógrafo e vice-prefeito do Emílio Pedutti.  Dizia ele, podem vir do jeito que quiserem, aqui tenho a toga, o chapéu, pente, espelho e cheirinho de café. Não! Ele, não servia cafezinho. Sua loja ficava ao lado da Torrefação e Moagem do Café Tesoro (assim mesmo, o dono devia ser espanhol) na Rua Curuzu.
                   Quadro montado, bonito, pronto para ser exposto na Farmácia ao lado da balança. Fim de novembro, tarde de sol, quase na hora da Ave-Maria.  Eu e o Sérgio tentamos levar o painel.  Pesadíssimo!  Não deu.  Chamamos o colega Odair para ajudar.  O paquerador, nessas tardes gostosas, fazia plantão no entorno do Cine Paratodos.  Pertinho de casa.  Em três vai?  Fomos!   Eu e o Sérgio tímidos, aquilo chamava uma atenção fora do normal.  O “cara-de-pau” do Odair, cigarro pendurado malandramente nos lábios, só na gozação; segurando o painel pelo meio.  Subimos a rua Djalma Dutra muito bem, pouca gente transita por ali.  A coisa ficou “brava” ao virarmos a calçada do cinema.  Íamos encostados nas paredes, com as fotos viradas para esse lado, para diminuir nossa “vergonha”.  Ainda bem que a Drogasil ficava no primeiro quarteirão da rua Amando.
                     Ufa! Chegamos.  Nesse horário, aos contrário do que desejávamos, a farmácia estava lotada.  Clientes curiosos vieram ver as fotos dos novos professores.
                     Alívio, missão cumprida, ... se não fosse isto:  cadê a fotografia da Professora Durvalina?  No nicho onde deveria estar a foto dela havia um parafuso solto.  Nossa mãe! Logo ela, tão séria, responsável, vaidosa. E o Odair cutucando atrás:  “cês tão ferrado, podem ir se preparando para a segunda-época em Biologia Educacional”, e ria muito o safado.   Sugeria: “digam a ela que o Menocchi (colega formando conosco que é filho da Durva) ajudou a fazer o painel”. “Ele vai limpar a barra de vocês dois”.  Ria de novo, “não sei não, acho que também ele vai ser reprovado”.
                     Resolvemos percorrer o caminho inverso, a procura do retrato. Demos sorte, lá estava a Durvalina – parece que com outra feição da foto original, desta vez, enfezada – caída no degrau do Cine Paratodos.
                    O grande painel, mostrando nossas fotografias, onde estávamos paramentados de mestres, da melhor Escola de Botucatu, expondo nossa conquista aos 60 mil habitantes da cidade, quase dizendo a quem nos via: Aqui estão os melhores de 1962!
                    São Paulo (SP), 15 de setembro de 2012.  (1962 – 2012)
                    Apresentada nas festividades do Jubileu de Ouro, na Escola Normal.          

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